O meu primeiro galão tem alguns meses. Entrei num café para tomar o pequeno-almoço. Estava febril, a garganta latejava, queria algo quente. Saíram-me as palavras pela boca, descontroladas, em jeito de menino que adivinha ir viver uma descoberta. "Era um galão, se faz favor!"
Mãos rápidas, habituadas à tarefa, puseram a bica a sair enquanto aqueciam o leite. Depois, o gesto formidável: num só movimento o café chocou com o leite e durante um momento existiram duas fases dentro do copo.
(lembro-me de reconhecer o fenómeno, de o ter identificado na memória. mas desta vez eu era o culpado. testemunhei o branco do leite a ficar tingido. alterado. morto. e um segundo depois, quando tudo parecia estar perdido, a renovação)
O galão ficou pronto. Esvaziei os dois pacotes de açúcar, dei utilização à colher e levei a bebida à boca. O gosto não era inteiramente novo mas soube-me maravilhosamente...
Senti-me suficientemente velho para apreciar o galão sem culpas. Reconheço na situação a novidade ingénua da descoberta, feita por alguém que se aprisionou a um mundo falso, manufacturado (neste caso sem galões) e que teve a oportunidade de se libertar.
Agora, que o frio chegou e voltei a olhar para esta fotografia, apetece-me repetir a experiência.
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