quarta-feira, janeiro 09, 2008

Quarteto

Eram quatro. E na simetria da vida escolheram ser duas raparigas e dois rapazes. Não era uma questão sexual nem de amor, a rede que os prendia era a amizade. A amizade exposta na melhor forma. Não pura, mas trabalhada, conversada, entendida, com agendas e horários capazes de atingir uma sofisticação tal, que de fora, quem não conhecia aquele quarteto, achava que tudo tinha lugar dentro da naturalidade do improviso. Mas não, não existiam ali forças cósmicas, a não ser eles os quatro.
Há anos que se juntavam na passagem de ano para organizar os 365 dias que se avizinhavam. Era uma tarefa extenuante que desenvolviam durante oito horas, mas que lhes dava um prazer enorme. Encontravam-se na casa de um deles às 20h em ponto, paravam durante 10 minutos para celebrar o ano novo, com abraços, beijos, sorrisos, votos sinceros, champanhe, panelas, passas, desejos, saltos de cadeira. À 00h05 voltavam para o trabalho até às 4 da manhã.
Durante essa noite utilizavam as folhas de Excel que traziam, já organizadas em meses e dias e punham a imaginação, a criatividade e o sentido prático a funcionar. Desenvolviam planos a longo prazo, expunham os projectos individuais e encontravam soluções para cada um. Marcavam férias, alternativas para as férias, planos Cês para o caso de tudo o resto correr mal, numa metodologia quase idiossincrática, visto que na maioria das vezes a coisa batia certo à primeira. Tudo isto infiltrado por um sentido extremo de humanismo e concessão, que trazia ao de cima algo que ninguém acreditaria - a espontaneidade. No final, os 12 meses projectados viviam de uma espontaneidade improvável resultando em vivências únicas.
Às 4 da manhã, quando se iam embora, a única promessa de ano novo que faziam uns aos outros era estarem ali, quatro horas antes do planeta começar uma nova translação.

2 comentários:

O Puto disse...

Um quarteto fantástico que só faria sentido num mundo paradoxal, onde seria possível essa espontaneidade planeada.

Randomsailor disse...

puto: o mundo já é paradoxal, e eu acredito na espontaneidade planeada. Mas tens razão, eles são mesmo um quarteto fantástico...;) (e obrigado por mostrares-me que é espontaneidade em vez de expontaneidade como eu tinha escrito, ugh!:P vou já corrigir e imprimir no cérebro!)